quarta-feira, 23 de maio de 2012

Mészáros: o partido como ferramenta de luta ofensiva dos trabalhadores

Por Demetrio Cherobini


                                                                                                      Todo mandato é minucioso e cruel
                                                                                                     eu gosto das frugais transgressões
                                                                                                                Mario Benedetti


Nos últimos anos, com as manifestações mais explosivas da crise do capital, muitas foram as tentativas de construção de mediações de combate que possibilitassem aos trabalhadores do mundo realizar reivindicações de variados tipos. Diversos foram os países em que homens e mulheres saíram organizadamente às ruas para questionar uma multiplicidade de acontecimentos, entre eles o fato de que as decisões fundamentais, de cunho político, econômico e social, que afetavam diretamente suas vidas, estavam sendo tomadas à revelia de suas vontades (1). Até mesmo o Brasil, guardadas as devidas proporções, foi palco para o pronunciamento de numerosas vozes, que, descontentes, clamavam por melhores condições de existência (2).

Essas organizações desempenham uma tarefa verdadeiramente árdua e indispensável: tomam ruas, ocupam praças, elaboram modos criativos de protesto, montam piquetes, pressionam, fazem agitação, enfrentam a repressão violenta do Estado, executam princípios de uma ação que se pode considerar como negativa em relação a essa ordem na qual a dinâmica sócio-metabólica se desenvolve sem que os sujeitos que a sustentam tenham a possibilidade de dar a ela um rumo consciente e coletivamente planejado.

A grande limitação de tais movimentos - e este é o seu calcanhar de Aquiles - é que são incapazes de transcender a ação meramente negativa (ou defensiva) e avançar no sentido deafirmar, na prática e em escala de massa, uma nova forma de regulação do metabolismo social que aponte para a superação definitiva do complexo contraditório do capital enquanto controlador fetichista e destrutivo da atividade produtiva humana.

Portanto, por mais valorosas que possamos considerar essas mediações, devemos forçosamente concluir que elas precisam, para levar suas batalhas adiante, até as últimas conseqüências, orientar-se de maneira ofensiva contra o capital. E esse salto programático só pode ser efetuado se os trabalhadores souberem fazer bom uso do instrumento cuja tarefa essencial é a de organizar as lutas de classes de uma forma em que se consiga ir além das reivindicações concernentes aos interesses parciais (econômicos) dos diversos setores da classe e, conseqüentemente, colocar em questão a própria relação antagônica - uma relação que épolítica, isto é, que envolve poder - existente entre capital e trabalho, que permeia a classe como um todo.

Esse instrumento de que estamos falando é o partido (3). A atribuição específica do partido é a de, justamente, politizar as lutas econômicas dos trabalhadores, ou seja, tornar-se veículo para que a consciência proletária ultrapasse o nível da particularidade e atinja o da totalidade concreta acerca do ser da sociedade na qual estão inseridos e que atualmente é controlada pelo sistema do capital. Numa palavra: o partido deve servir de mediação entre a classe revolucionária e a consciência revolucionária (4).

Para tanto, o partido necessita ter a melhor preparação teórica e política possível -profissionalizar-se, em todos os âmbitos da práxis revolucionária -, ao mesmo tempo em que se mantém organicamente vinculado às fileiras proletárias. Ele não é, nesse contexto, o causador da revolução, mas a ferramenta dialética que ensina e aprende com os trabalhadores e que lhes possibilita apreender concretamente as múltiplas determinações sócio-metabólicas que afetam as suas existências.

Comprando diariamente as lutas da classe trabalhadora, inserindo-se em seu interior, realizando denúncias sobre as arbitrariedades do capital, fazendo agitação político-ideológica, usando as palavras de ordem adequadas, educando e preparando material, tática e estrategicamente as massas para a atividade revolucionária – as batalhas ofensivas com o fim de formar mediações alternativas de regulação da produção -, o partido se converte em elemento efetivo de emancipação.

O partido não pode, portanto, em hipótese alguma, permanecer a reboque das causas economicistas dos trabalhadores, mas sim buscar a elevação da consciência das massas a partir da conjugação de ações negativas e afirmativas em todos os espaços passíveis de intervenção política.

Sua própria forma de constituição interna, nesse contexto, precisa ser prenunciadora de uma formação social qualitativamente superior. Organização e orientação estratégica são, aqui, duas faces de uma mesma moeda. Isso quer dizer, em outras palavras, que as mediações alternativas da luta proletária – partido incluso - não podem se estruturar de uma maneira que reproduza a lógica de funcionamento sócio-metabólico do capital – um modo de controle hierárquico efetichista da atividade produtiva.

A proposta da ofensiva socialista de que fala Mészáros exige dos interessados na superação do sistema esforços para a efetivação progressiva, já no presente, de um tipo de organização diverso do que está posto pela realidade alienante do capital.

Notas:

(1) O ano de 2011 foi marcante nesse sentido. Para uma boa leitura acerca de tais acontecimentos, vale a pena conferir a entrevista de Ricardo Antunes para Valéria Nader e Gabriel Brito, “Luta pelos direitos do trabalho é hoje vital diante da crise cabal do capitalismo”,Correio da Cidadania, 08/09/2011, disponível em
http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id= 6262 Como explica o sociólogo brasileiro, ainda que cada uma dessas manifestações tenha tido a sua singularidade, todas elas revelam um traço comum: expressar um profundo descontentamento em relação à ordem em que se inserem - ordem esta marcada, de uma forma ou de outra, pela grave crise do capital.
(2) Sobre esse ponto, é útil ler o bom artigo de Fernando Marcelino “Quatro lições sobre a nova dinâmica da luta de classes no Brasil”, Correio da Cidadania, 17/02/2012, disponível em
http://www.correiocidadania.com.br/index.phpoption=com_content&view=article&id=6816:submanchete140212&catid=25:politica&Itemid=47. Ressalte-se, ainda, nesse contexto, o fato de que, entre os anos de 2009 e 2010, houve 964 greves no Brasil.
(3) Apesar de não ser um tema central de sua vasta obra, Mészáros afirma que os partidos podem ser mediações efetivas nas lutas de classes a favor dos trabalhadores. Apresentamos algumas de suas concepções a respeito num pequeno artigo, “Por um partido socialista de orientação estratégica ofensiva: notas a partir de István Mészáros”,Correio da Cidadania, 18/11/2011, disponível em 
(4) Mészáros usa o termo – retirado d’A ideologia alemã – consciência socialista de massa para se referir à consciência revolucionária dos trabalhadores. Esse tipo de consciência deve dar conta de compreender não somente o que precisa ser negado pela práxis transformadora – o sistema de mediações do capital -, mas, também, fundamentalmente, aquilo que necessita ser afirmado em seu lugar, a comunidade dos homens e mulheres que regulam, de forma consciente e autônoma, o metabolismo social humano.


Demetrio Cherobini é cientista social, doutorando em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina.

FONTE: Correio da Cidadania

sábado, 19 de maio de 2012

BLANQUI, Louis-Auguste


Nasceu no dia 10 de fevereiro de 1805 em Puget-Théniers, Nice, na França. Filho de um membro da Convenção de 1793, desde a idade de 16 anos já participava de associações revolucionárias secretas.

Estudou Medicina e Direito, mas dedicou-se inteiramente à política.

Nos fins de 1829 foi membro da redação do jornal liberal de esquerda "Globe" fundado por Pierre Leroux. Participou de todos os levantes, insurreições, tentativas de golpe que se verificaram na França de 1830 a 1870, com exceção da Comuna de Paris em 1871, pois se encontrava preso no ano de sua eclosão, o que não impediu que os seus seguidores o elegessem presidente da Comuna de Paris.

Na França, após a queda de Napoleão, a monarquia Bourbom é recolocada no poder, que por sua vez foi sucedida por Luis Filipe em 1830 com o apoio da burguesia financeira. Esse quadro se contrapõe aos interesses da burguesia industrial e comercial: seus representantes republicanos se mobilizam contra o governo de Luis Filipe. Insurreições voltam a ocorrer em Paris e Lyon. Formam-se sociedades secretas que abrigavam setores burgueses descontentes, conspiradores e socialistas. Entre esses últimos, Auguste Blanqui  líder  da Sociedade das Estações que em 1839 ocuparia a Prefeitura de Paris.

Segundo Norman Masckenzie, Auguste Blanqui “passou grande parte de sua vida cumprindo penas de prisão e o resto organizando o operariado revolucionário de Paris”.

Considerado “aluno” de Gracchus Babeuf e Philipe Buonarroti, lideres da “Conspiração dos Iguais” ocorrida em 1796, defendia que a classe dos trabalhadores seria a principal força opositora aos capitalistas e aos grandes proprietários rurais, e a eles, trabalhadores, caberia, sob a liderança de um grupo disciplinado de revolucionários profissionais, tomar o poder.

Foi membro da sociedade secreta conhecida como "Sociedade dos Amigos do Povo", criou outras ( "Sociedade das Famílias", "Sociedade das Estações", "Sociedade Central Republicana"), fundou os jornais "La Patrie en Danger" (1870) e "Ni Dieu ni Maître" (1879), defendendo sempre posições revolucionárias. 

Preso durante grande parte de sua vida (1832, 1834, 1836, 1839, 1849, 1861, 1870) que soma um total de 33 anos, chegou a ser condenado à prisão perpétua e à pena de morte (por duas vezes).

Sua primeira prisão leva-o ao Tribunal do Sena, cuja audiência acontece nos dias 10, 11 e 12 de janeiro de 1832, sob a presidência de Jacquinot-Godard, sob a acusação de "alterar a paz pública" com seus pronunciamentos. Blanqui se defende, dirigindo-se aos jurados,  nos seguintes termos:
Acusam-me de ter dito a trinta milhões de franceses, proletários como eu, que tinham o direito de viver. Se isto é um delito, creio que, pelo menos, deveria responder por ele, diante de homens que não fossem ao mesmo tempo juizes e parte na mesma causa. (...) Contudo, dado que é meu dever de proletário, privado de todos os seus  direitos civis, rejeitar como ilegítima a competência de um tribunal no qual se sentam apenas os privilegiados, os quais não são de modo algum os meus iguais, (...)
Blanqui se autoproclamava comunista. Afirmava que o comunismo não poderia se estabelecer a não ser por etapas, à medida que o povo fosse sendo preparado por um sistema educativo implantado num período transitório de ditadura revolucionária, exercida esta por associações urbanas e rurais, até que se tornasse desnecessário qualquer forma de Estado.

Ao invés de um partido de massa, acreditava que a tomada do poder só poderia acontecer através de um golpe de Estado promovido por uma minoria consciente de revolucionários disciplinados, cabendo a esse grupo orientar os trabalhadores organizados em suas associações, conduzindo-os pelo caminho da revolução, implantando a ditadura que construiria a base da nova sociedade comunista. Esta tática revolucionária passou a ser denominada, entre socialistas e comunistas, como blanquismo. Quanto à questão de como seria organizada essa sociedade comunista, Blanqui se recusava a descrever ou demonstrar antecipadamente, porque segundo ele, depois da revolução a nova sociedade dependeria da vontade do povo.

Fazia muitas críticas às tendências socialistas que defendiam a via parlamentar como caminho da revolução. Contra as idéias dos utopistas que consideravam que se deveria investir na educação como elemento da mudança da mentalidade, Blanqui afirmava que era impossível criar esse novo homem pela educação, enquanto ela fosse praticada sob a velha sociedade, pois só com o advento da nova ordem social é que se forjaria o homem novo.

Louis-Auguste Blanqui faleceu em 1º de janeiro de 1881, dias depois de ter sofrido um ataque de apoplexia quando fazia um discurso num comício  em Paris.

Blanqui não nos deixando qualquer obra sistematizada. Vários artigos escritos que saíram no jornal "La Patrie en Danger" foram organizados em livro sob o título "La Critique Sociale" publicado em 1883, após sua morte, portanto.
  
Entre suas contribuições espalhadas em vários folhetos, artigos, manifestos e ensaios, citam-se: "Carte a Maillard" (1852), "Logique" (1855), "De la Connaissance de l'ame" (1857), "Le Communisme l'avenir de la Société" (1869), "L'eternité par les astres" (1872), "L'armée esclave et opprimée" (1880).


(Dados compilados por Aluizio Moreira)


Fontes:
Arquivo Marxista na Internet
BEER, Max. História do socialismo e das lutas sociais.São Paulo:Expressão Popular,2006.
BRAVO, Gian Mario. Historia do socialismo. Lisboa:Europa-America, 1977, 3 vols.
COLE, G.D.H. Historia del pensamiento socialista.Mexico:Fondo de Cultura, 1957-1960, 7 vols.
DROZ, Jacques (Dir). Historia geral do socialismo. Lisboa: Horizonte, 1972-1977, 9 vols.
HOFMANN, Werner. A historia do pensamento do movimento social dos séculos 19 e 20. Rio de Janeiro:Tempo Brasileiro, 1984.
PETITFILS, Jean-Christian. Os socialistas utópicos. São Paulo: Circulo do Livro, s/d.

terça-feira, 8 de maio de 2012

O exemplo vem da Islândia - II

SILÊNCIO ABSOLUTO SOBRE A ISLÂNDIA 

Por Anibal


Se há quem acredite que nos dias de hoje não existe censura, então que nos esclareça porque ficámos a saber tanta coisa acerca do que se passa no Egipto e porque é que os jornais não têm dito absolutamente nada sobre o que se passa na Islândia.

Na Islândia:
- o povo obrigou à demissão em bloco do governo;
- os principais bancos foram nacionalizados e foi decidido não pagar as dívidas que eles tinham contraído junto dos bancos do Reino Unido e da Holanda, dívidas que tinham sido geradas pelas suas más políticas financeiras;
- foi constituída uma assembleia popular para reescrever a Constituição.

Tudo isto pacificamente. Uma autêntica revolução contra o poder que conduziu a esta crise. E aí está a razão pela qual nada tem sido noticiado no decurso dos últimos dois anos. O que é que poderia acontecer se os cidadãos europeus lhe viessem a seguir o exemplo?

Sinteticamente, eis a sucessão histórica dos factos:

- 2008: o principal banco do país é nacionalizado. A moeda afunda-se, a Bolsa suspende a actividade. O país está em bancarrota.

- 2009: os protestos populares contra o Parlamento levam à convocação de eleições antecipadas, das quais resulta a demissão do primeiro-ministro e de todo o governo.

A desastrosa situação económica do país mantém-se. É proposto ao Reino Unido e à Holanda, através de um processo legislativo, o reembolso da dívida por meio do pagamento de 3.500 milhões de euros, montante suportado mensalmente por todas as famílias islandesas durante os próximos 15 anos, a uma taxa de juro de 5%.

- 2010: o povo sai novamente à rua, exigindo que essa lei seja submetida a referendo.

Em Janeiro de 2010, o Presidente recusa ratificar a lei e anuncia uma consulta popular.

O referendo tem lugar em Março. O NÃO ao pagamento da dívida alcança 93% dos votos.

Entretanto, o governo dera início a uma investigação no sentido de enquadrar juridicamente as responsabilidades pela crise. Tem início a detenção de numerosos banqueiros e quadros superiores. A Interpol abre uma investigação e todos os banqueiros implicados abandonam o país.

Neste contexto de crise, é eleita uma nova assembleia encarregada de redigir a nova Constituição, que acolha a lições retiradas da crise e que substitua a actual, que é uma cópia da constituição dinamarquesa. Com esse objectivo, o povo soberano é directamente chamado a pronunciar-se. São eleitos 25 cidadãos sem filiação política, de entre os 522 que apresentaram candidatura. Para esse processo é necessário ser maior de idade e ser apoiado por 30 pessoas.

- A assembleia constituinte inicia os seus trabalhos em Fevereiro de 2011 a fim de apresentar, a partir das opiniões recolhidas nas assembleias que tiveram lugar em todo o país, um projecto de Magna Carta. Esse projecto deverá passar pela aprovação do parlamento actual bem como do que vier a ser constituído após as próximas eleições legislativas.

Eis, portanto, em resumo a história da revolução islandesa:

- Demissão em bloco de um governo inteiro;
-- Referendo, de modo a que o povo se pronuncie sobre as decisões económicas fundamentais;
- Prisão dos responsáveis pela crise e
- reescrita da Constituição pelos cidadãos:

Ouvimos falar disto nos grandes media europeus?

Ouvimos falar disto nos debates políticos radiofónicos? Vimos alguma imagem destes factos na televisão? Evidentemente que não!

O povo islandês deu uma lição à Europa inteira, enfrentando o sistema e dando um exemplo de democracia a todo o mundo.



(Por DESEMPREGADOS, in Facebook)

O exemplo vem da Islândia - I



Islândia. O povo é quem mais ordena. E já tirou o país da recessão.

Por Joana Azevedo Viana   

A crise levou os islandeses a mudar de governo e a chumbar o resgate dos bancos. Mas o exemplo de democracia não tem tido cobertura


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"Nem o frio pára o povo: duas revoluções pacíficas
já levaram a grandes mudanças." 
Os protestos populares, quando surgem, são para ser levados até ao fim. Quem o mostra são os islandeses, cuja acção popular sem precedentes levou à queda do governo conservador, à pressão por alterações à Constituição (já encaminhadas) e à ida às urnas em massa para chumbar o resgate dos bancos. 

Desde a eclosão da crise, em 2008, os países europeus tentam desesperadamente encontrar as soluções económicas para sair da recessão. A nacionalização de bancos privados que abriram bancarrota assim que os grandes bancos privados de investimento nos EUA (como o Lehman Brothers) entraram em colapso é um sonho que muitos europeus não se atrevem a ter. A Islândia não só o teve como o levou mais longe.

Assim que a banca entrou em incumprimento, o governo islandês decidiu nacionalizar os seus três bancos privados - Kaupthing, Landsbanki e Glitnir. Mas nem isto impediu que o país caísse na recessão. A Islândia foi à falência e o Fundo Monetário Internacional (FMI) entrou em acção, injectando 2,1 mil milhões de dólares no país, com um acrescento de 2,5 mil milhões de dólares pelos países nórdicos. O povo revoltou-se e saiu à rua.

Lição democrática n.º 1: Pacificamente, os islandeses começaram a concentrar-se, todos os dias, em frente ao Althingi [Parlamento] exigindo a renúncia do governo conservador de Geir H. Haarde em bloco. E conseguiram. Foram convocadas eleições antecipadas e, em Abril de 2009, foi eleita uma coligação formada pela Aliança Social-Democrata e o Movimento Esquerda Verde - chefiada por Johanna Sigurdardottir, actual primeira-ministra.

Durante esse ano, a economia manteve-se em situação precária, fechando o ano com uma queda de 7%. Porém, no terceiro trimestre de 2010 o país saiu da recessão - com o PIB real a registar, entre Julho e Setembro, um crescimento de 1,2%, comparado com o trimestre anterior. Mas os problemas continuaram.


Lição democrática n.º 2: Os clientes dos bancos privados islandeses eram sobretudo estrangeiros - na sua maioria dos EUA e do Reino Unido - e o Landsbanki o que acumulava a maior dívida dos três. Com o colapso do Landsbanki, os governos britânico e holandês entraram em acção, indemnizando os seus cidadãos com 5 mil milhões de dólares [cerca de 3,5 mil milhões de euros] e planeando a cobrança desses valores à Islândia.

Algum do dinheiro para pagar essa dívida virá directamente do Landsbanki, que está neste momento a vender os seus bens. Porém, o relatório de uma empresa de consultoria privada mostra que isso apenas cobrirá entre 200 mil e 2 mil milhões de dólares. O resto teria de ser pago pela Islândia, agora detentora do banco. Só que, mais uma vez, o povo saiu à rua. Os governos da Islândia, da Holanda e do Reino Unido tinham acordado que seria o governo a desembolsar o valor total das indemnizações - que corresponde a 6 mil dólares por cada um dos 320 mil habitantes do país, a ser pago mensalmente por cada família a 15 anos, com juros de 5,5%. A 16 de Fevereiro, o Parlamento aprovou a lei e fez renascer a revolta popular. Depois de vários dias em protesto na capital, Reiquiavique, o presidente islandês, Ólafur Ragnar Grímsson, recusou aprovar a lei e marcou novo referendo para 9 de Abril.

Lição democrática n.º 3: As últimas sondagens mostram que as intenções de votar contra a lei aumentam de dia para dia, com entre 52% e 63% da população a declarar que vai rejeitar a lei n.o 13/2011. Enquanto o país se prepara para mais um exercício de verdadeira democracia, os responsáveis pelas dívidas que entalaram a Islândia começam a ser responsabilizados - muito à conta da pressão popular sobre o novo governo de coligação, que parece o único do mundo disposto a investigar estes crimes sem rosto (até agora).

Na semana passada, a Interpol abriu uma caça a Sigurdur Einarsson, ex-presidente-executivo do Kaupthing. Einarsson é suspeito de fraude e de falsificação de documentos e, segundo a imprensa islandesa, terá dito ao procurador-geral do país que está disposto a regressar à Islândia para ajudar nas investigações se lhe for prometido que não é preso.

Para as mudanças constitucionais, outra vitória popular: a coligação aceitou criar uma assembleia de 25 islandeses sem filiação partidária, eleitos entre 500 advogados, estudantes, jornalistas, agricultores, representantes sindicais, etc. A nova Constituição será inspirada na da Dinamarca e, entre outras coisas, incluirá um novo projecto de lei, o Initiative Media - que visa tornar o país porto seguro para jornalistas de investigação e de fontes e criar, entre outras coisas, provedores de internet. É a lição número 4 ao mundo, de uma lista que não parece dar tréguas: é que toda a revolução islandesa está a passar despercebida nos media internacionais. 


FONTE: Hoje.Portugal

domingo, 6 de maio de 2012

Ex-países socialistas enfrentam crise no capitalismo

Por Aluizio Moreira

Não há quem desconheça as desagregações das sociedades socialistas a partir dos finais da década de oitenta do século passado, com o retorno/implantação do capitalismo naquelas sociedades.

Processo que culminou com o desintegração da URSS, da Iugoslavia, desmembramento da Tchecoslovaquia, desaparecimento da Alemanha Oriental, e o surgimento de repúblicas independentes como Letônia, Estônia, Lituânia, Ucrânia, Belarus, Croácia, Eslovênia, Bósnia, entre outras.

Países aqueles cuja população há mais de duas décadas não ouvia falar em revisão de sistema de aposentadoria, contenção de gastos com a saúde pública, redução do poder aquisitivo, desnacionalização de sua economia frente à invasão de empresas transnacionais, recorrência a empréstimos às entidades financeiras internacionais, tal qual qualquer país acometido pelas perturbações cíclicas do sistema capitalista.

Poucos conhecem os graves problemas que essas sociedades enfrentam na atualidade após a adoção de um modelo econômico que atravessa uma crise profunda, e segundo alguns analistas, impossível de solucioná-la dentro do sistema.
  
Em março deste ano, professores da ex-República Socialista da Estônia, entraram em greve que duraria três dias, contra os baixos salários da categoria.

No final de abril postamos um artigo de Gyula Thürmer, Presidente do Partido Comunista da Hungria, analisando a crise econômica que atravessa aquele país, após retorno ao capitalismo.

Ainda em abril, uma manifestação de grande envergadura contra o governo, aconteceu em Praga, que debate-se numa crise econômica de grandes proporções.

No mesmo mês, na Eslovênia, ex-Yugoslávia desde 1991, aconteceu a maior greve de professores, médicos, policiais e outros funcionários públicos. Cerca de 100 mil funcionários foram às ruas contra os cortes salariais, redução dos auxílios na saúde, previstos no pacote de austeridade do governo.

O fato é que a imprensa ocidental pouco ou nada informa sobre esses fatos.

Vejamos nos videos a seguir os registros  desses acontecimentos. 

FONTES: Opera Mundi
                   Euronews
                   Diario Liberdade

Professores estonianos fazem greve

Ucrânia: protestos contra presidente

Manifestações na Polónia denunciam política do...

Checos insurgem-se contra austeridade

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Protesto gigantesco na República Checa


Manifestação popular em Praga
- 150 mil manifestantes em Praga abalam o governo de dirieita
- A maior manifestação de sempre desde a restauração do capitalismo 



Sábado, 21 de Abril, 150 mil pessoas manifestaram-se nas ruas de Praga. Foi uma das maiores manifestações, se não a maior, desde a restauração do capitalismo em 1989.

Convocada pela Confederação dos Sindicatos Checos e Moravos (CMKOS), a manifestação pôs em causa o plano de austeridade do governo direita, adoptado em Abril, que prevê uma série de medidas anti-sociais nos moldes dos planos adoptados na Grécia, em Portugal e na Espanha.

Dentre as medidas avançadas pelo governo estão a alta da taxa de IVA, o congelamento das aposentações, a redução drástica dos orçamentos da educação e da saúde, dos desembolsos médicos e ainda a privatização progressiva dos sistemas de segurança social e da educação superior. 

No cortejo, numerosos militantes sindicais do CMKOS, membros de 21 associações cívicas e também vários milhares de militantes comunistas marcharam ostentando bandeirolas onde se lia: "Façamos o governo fracassar". 

Também foram exibidas palavras de ordem mais gerais, ilustrando a desilusão dos checos para com o sistema restaurado em 1989. Elas resumiam-se na palavra de ordem simples de "Abaixo o capitalismo!"

Após o comício o presidente do CMKOS, Jaroslav Zavadil denunciou os ministros que "humilham os humildes com suas reformas anti-sociais". E acrescentou: "Eles nos prometeram a responsabilidade orçamental, mas trata-se sim da dívida do governo que está em vias de aumentar".

"Eles prometeram lutar contra os subornos mas a corrupção gangrenou os seus partidos e toda a sociedade. É demasiado – é necessário que o governo recue e que se façam eleições antecipadas", declarou Zavadil.

A amplitude da frente social, as divisões no seio de um coligação governamental minada por escândalos de corrupção sem precedente poderiam fazer explodir nesta 6ª. feira um governo que se sustém por um fio.

O voto de confiança de 6ª feira 27 de Abril é decisivo para o futuro da coligação de direita constituída em 2000 entre o partido de direita tradicional ODS, o partido de Vaclav Havel e Vaclav Klaus e duas novas formações liberais, TOP 09 e Assuntos Públicos (AP), atingidas em pleno por escândalos de corrupção que implicaram nomeadamente a dissolução da AP. 

Para o Partido Comunista da Boémia-Morávia (KSCM), o governo "não tem mais nenhuma legitimidade" e é indispensável convocar eleições antecipadas, "única solução possível". 

O KSCM exige do governo que ouça as solicitações populares que "ponha um fim à destruição da economia checa e ao recuo progressivo das condições de vida do povo".

O KSCM, com seus 100 mil aderentes, seus 26 deputados e seus 11,9% nas últimas legislativas é actualmente o principal partido de oposição na República Checa ao capitalismo triunfante após a contra-revolução de veludo.

Segundo as últimas estimativas, ele obteria um avanço histórico em caso de eleições antecipadas uma vez que atingiria o segundo lugar, atrás do Partido Social-Democrata, obtendo cerca de 20% dos votos.

Mais de vinte anos após a restauração capitalista na República Checa, como em toda a Europa do Leste, a desilusão é imensa em relação a um sistema capitalista que havia prometido prosperidade e liberdade e que não levou senão à austeridade e autoritarismo. 


FONTES: Solidarité Internationale PCF 
                   Resistir.info
                   Euronews